quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Rendida ao táxi e ao taxista

Acho que não houve e nem haverá um dia em que fiquei mais tempo dentro de um táxi.
Em algumas corridas por escolha própria, em outras por obra de atrasos e importunos desse vai e vem.
O fato é que me lembrei de uma crônica de Clarice (na intimidade) sobre a solidariedade, não me recordo o nome exato, mas enquanto as coisas foram acontecendo fui resgatando seu enredo indo de encontro com o meu desfecho. Na minha segunda corrida de táxi de hoje, curiosamente fui indagada se gostava de literatura, pelo taxista. Respondendo que sim, ele questionou mais precisamente, se gostava de literatura - sem ser acadêmica, disse que gostava ainda mais. Já estava espantada e ansiosa para ouvir o motivo da pergunta. Foi quando o taxista me apresentou um livro que tratava justamente sobre sua vida profissional, da vida dentro de um táxi e suas histórias. Contando um pouco sobre a estrutura do livro, logo desconfiei que ele mesmo era o autor. Dei crédito, afinal, não é todo dia que vemos um empreendimento assim. Ao tentar me convencer sutilmente pela compra, contou-me adiantadamente algumas histórias narradas no livro e enfatizava que não eram fictícias e que ele tinha sido participante delas. Folheei o livro e comecei a achar aquilo fascinante, afinal, não tem muito tempo que imaginei justamente isso. Num instante oportuno, declarei-me psicóloga ao taxista que prontamente me falou de Freud e não pude esconder o sorriso (sei lá se sínico, mas ri), me contou até de um psicanalista que fala na rádio. Já estava decidida a comprar o livro, mas sabendo do preço desanimei, mesquinharia ou não, sabia que devia levar, e levei sem pestanejar muito. Algo dentro de mim estava estranho, eu dei crédito e ao mesmo tempo desmereci, duvidando da capacidade daquele sujeito de escrever um livro que realmente me tocasse. No final senti-me pressionada por mim mesma a comprá-lo. Nada me obrigava àquilo mas soava imposição. Imagine só se eu descartasse aquela obra como se descarta um panfleto entregue na rua? Para mim fazer isso seria inadmissível, aliás o taxista me convenceu, chegou me despertar interesse na leitura. Enfim, cansei de me condenar pelo sim e pelo não. Chegando e acomodando-me no ônibus da rodoviária para casa, engatei a leitura na velocidade da viagem. Então... Li! Em algumas frases lidas fiz careta, em outras aquela expressão de "óoó", li todo o livro. Esperava mais. Mas o que há de errado? É claro que não fui caridosa, nem tão pouco acreditei que leria um livro excepcional de literatura, mas no fim das contas admirei o cara. Com jeito de boa praça, fez o que tinha que fazer, relatou as histórias, escreveu um livro, publicou-o, possivelmente vende aos montes para os passageiros e no livro dá o seu recado e sobretudo ganha mais clientes para as corridas, sem demagogia, essa é a lógica. Mais interessante ainda é que introspectivamente analisei e reanalisei meus pensamentos e sei que parecia haver um movimento em mim que dizia não inveje, não critique e não condene, e cá estou eu  impacta com o vivido e rendida ao taxista, contando para vocês.      

sábado, 12 de novembro de 2011

Devaneios de uma vida sem respostas

Algumas pessoas carregam em si virtudes e limites que às vezes pesam como fardos. É  claro que para isso existem razões, obscuras e duras de se saber. Ou que não se pode, não se deve, não se quer saber. Começo analisar os comportamentos humanos (sobretudo o meu) e me intriga a cada dia mais a loucura cotidiana com as coisas corriqueiras e as proporções que tomam. Facilmente percebidas e dificilmente desveladas. Não recomendo subestimar a capacidade do homem de ser complexo, de ser avesso, de se atropelar pelas escolhas da vida, de se modular conforme sua dor e desapontamento, naquilo que não dá conta, a sua própria existência. Não se trata de uma configuração pejorativa de reflexão. Mesmo porque, como posso entender o súbito desespero de não aceitar a realidade difícil na qual estamos inseridos? Não há como contestar, ainda com as tentativas de colocar a deriva do acaso os acontecimentos indesejáveis, ninguém (desse mundo) sabe viver, em todas as circunstâncias. Se alguém souber, desafio as evidências. Para não finalizar com tom pessimista, conformo-me com a angústia da crítica colocada. O que me dá contento é não estar no engano, não iludir-me com receitas prontas de felicidade e de condutas corretas, compartilhando com a ideia de uma massa de gente mascarada pelo vazio que invade a todos, não há como escapar. Prefiro os resquícios de direção que as minhas dificuldades me assinalam e não encarar a vida como um todo pronto e acabado. Assim talvez entendamos os altos e baixos, nossas virtudes e limites, e respeitemos mais o ser humano tal como é, incompleto.