terça-feira, 20 de novembro de 2012

Outro lado da moeda

(Na grande maioria das pessoas, resta sempre algo da ordem do indomável e do ineducável, que a cultura é incapaz de controlar. Freud observa que "aqueles que desejam ser mais nobres do que suas constituições lhes permitem são vitimados pela neurose. Esses indivíduos teriam se sentido melhor se lhes fosse possível ser menos bons.")

Trecho retirado do livro de Nina Saroldi: O mal estar da civilização - as obrigações do desejo na era da globalização

Nós seres humanos com nossas exigências internas não conseguimos nos esquivar dos padrões nos quais tentamos nos enquadrar e de um sofrimento proveniente dessa impossibilidade. E que muitas vezes causam danos reversíveis, porém muito trabalhosos. Há que se repensar esse movimento humano, que caminha incansavelmente para um outro nível de neurose, diferente das do tempo de Freud, mas que funciona talvez de uma mesma forma - com o mesmo 'para quê'. O trecho acima me fez refletir para o ponto crucial "se sentiriam melhor se fossem menos bons". Ouço pessoas que se queixam diariamente de tentar ser perfeito demais. Essa é uma cilada moderna. Uma forma de aprisionamento talvez que nos autoriza nesse extremo, como se nele fosse permitido abusar. Não quero sugerir que as pessoas não tem que tentar ser melhores, mas colocar esse ideal antes de tudo e angustiar-se a tal ponto, não leva a progresso e nem a andamento nenhum.  Precisa haver uma tentativa, da mesma forma que pode haver falhas e do mesmo jeito que se pode acertar! Tudo na vida tem o seu lugar.

"O inimigo do bom é o melhor".






domingo, 18 de novembro de 2012

Só não sei a direção

Abro a janela e deixo o sol entrar.
Deito na cama, tento não me ocupar.
Ao meu redor tudo sabe o que eu devo fazer.
Eu não sei, não tenho a direção.
Ainda não sei me acalmar. Não aprendi a descansar.
Sei dos planos, dos sonhos e dos afetos.
Mas às vezes não sei, não tenho a direção.
Sei dos livros, das músicas e dos sapatos.
Me vejo neles, me sinto neles, me apego a eles.
Pode amanhecer e anoitecer. Não posso mais diferenciar.
Abro as cortinas e fecho as janelas. Quero o ar  e não os olhares.
Abro as janelas e fecho as cortinas. Quero os olhares e não quero o frio.
Deito na cama porque tenho com o que me preocupar. Tenho o que fazer.
Fica para amanhã e fica para depois. Preciso descansar.
Sei dos gestos, sei das palavras, sei do silêncio. Um infinito particular.
Sei dos acordes, sei dos tons e sei dos sons.
Só não sei a direção, não sei o ritmo.
Não entendo o compasso do coração.



domingo, 11 de novembro de 2012

Vi-vendo para ver

O mundo me promete progresso e eu acredito. O mundo me pede paciência e eu insisto. O mundo me pede para acreditar e eu desconfio. Disseram-me muitas coisas. Que vence o melhor, que precisamos uns dos outros, que tenho que fazer sempre mais, que devo dar a face para o outro bater. Eu sempre me pergunto se ainda existem verdades nesse conjunto de informações. Nada concluo. Num dia se aprende a ceder, no outro se aprende a perder, e no outro você descobre que é  muito mais que isso. Vão dizer para seguir o coração e agir com a razão. Vão dizer seja forte mas saiba que fraquejar é normal. Vão dizer que auto-estima resolve tudo e que não tem fórmula pronta. Cada ser humano tem suas infinitas teorias de como viver. Tal qual os cientistas, se esquece que sempre cuidamos das leis e mal sabemos aplicá-las. Compreendê-las não é vivê-las, ainda que seja o primeiro passo. Inevitável e felizmente temos capacidade para proteger nossa estima de que vamos aprender direitinho o que é melhor a fazer. E que o tempo nos tornará sábios para encarar o que vier pela frente. E mais uma vez eu me pergunto. Que progresso é possível? Pessoas acostumadas a achar que aprenderam com a vida, exalam uma certa arrogância da conquista da verdade. Eu sei que é assim, dizem, eu já passei por isso. E as leis gerais do comportamento funcionam de forma a sugerir que se deva levar em conta, afinal é a experiência dizendo. Paciência, até que ponto? Às vezes, o que mais precisamos é saber mudar a rota, é não esperar mais por algo que minha vã insistência entende como caminho. Arrancar das minhas convicções que ao invés de pacientemente aguardar dádivas, eu posso me esforçar mais, essa é uma necessidade ignorada. A vida deveria ser uma eterna investigação científica séria. Onde as hipóteses serão testadas e acreditar ou não é só questão de evidências. Nossa frágil ingenuidade nos coloca na posição de submissão frente às crenças que inconscientemente o mundo nos impõe. Acredite que aquilo lhe fará feliz, acredite que você vai vencer, que acreditar que tudo vai dar certo como condição para sucesso. Uma medida de dúvida se presta mais a fazer acontecer que a própria crença. Pois é quando eu não sei o que vai acontecer que eu me entrego, arriscando com a margem de segurança de quem pode não ter feito a melhor escolha, mas que a faz. Na balada da contra-mão, exercito-me pondo em xeque àquilo que enraizado está na sabedoria cotidiana. Posso ter elencado uma porção de bobagens, mas a atividade crítica do que instituiu-se como generalizações no mundo certamente me incomoda. A cada homem a vida ensina de forma particular. Faremos sempre trocas de saberes e experiências, teremos sempre sabedorias a partilhar, crendices nas quais se apoiar e verdades em que iremos acreditar. Basta não aceitar tudo sem crivo, sem critério e sem a sua própria vivência para as conclusões tirar.

E assim, desejo um pouco de dúvidas a você.