sábado, 13 de janeiro de 2018

A letra, a voz e a falta

Há um tempo venho percebendo minha dificuldade de nomear certas coisas. Ao mesmo tempo em que cresce em mim a necessidade de que alguém (ou algo) nomeie essas coisas e, principalmente, dê nome, significado, a quem sou. Parece estranho, mas, é isso que eu sinto quando aprecio, com algum humor, os signos. Apesar de eu não acreditar muito em astrologia, sinto um alívio quando leio ou ouço determinados dizeres que me enquadram, me descrevem ou fazem algum sentido. Tal fato pode ser ilustrado também com os testes de facebook. Quem não gosta de brincar de ver quais qualidades e defeitos tem, quantos porcento disso ou daquilo te definem? Parece que alguma coisa desse tipo de comportamento demonstra o quanto esperamos uma construção pronta de quem nós somos. Quando vamos falar de nós evocamos expressões, palavras, que nos acompanham, talvez, pela vida inteira. Acho bem difícil me desapegar das minhas palavras, vivo buscando outras letras que dêem um novo sentido sobre mim, mas, vejo que giro em torno das mesmas há um tempo. Espero conseguir me despedir de uma por vez, e me apegar a outras que possam preencher esse espaço.
Viver, para mim, é escrever, ao pé da letra, o que aprendi ser, como me desfiz e me refiz, como me reinventei.

Escrevo isso porque, de alguma maneira, penso que minha voz será ouvida. Por pensar que há alguma importância no que eu digo, de que há alguém que se interessa em escutar, escrevo na intenção de me comunicar, de expressar meus sentimentos, minhas angústias. Não sei se serei ouvida, se serei lida, mas acho que nós temos essa necessidade. É tão importante ter voz, poder dizer. Embora o descontentamento que surge da revelação que não há quem queira te ouvir é tão difícil de ser superado. Vozes são interpostas, sobrepostas, entrecruzadas e fuzilam os ouvidos. A sensação, de senso comum, é que ninguém se ouve. Sempre compartilho com amigos que são bons ouvintes o quanto isso é precioso. Dar voz a nós mesmos e a outras pessoas, sejam elas distantes ou próximas, é invariavelmente uma prova de amor. Em um mundo em que há a supremacia do "time is money", dedicar tempo para ouvir é um exercício de paciência, de tornar sujeito, de dar um lugar para os afetos. Nós, seres humanos, precisamos melhorar muito nesse quesito. Nós calamos muitos dos que vivem conosco, mentalmente, fingimos ouvir, mas, somos surdos para quem tem alguma dificuldade de selecionar o que queremos ouvir. Escutar requer muito de nós.

Com essa carência de ressonância com o mundo exterior do que ecoa no nosso interior, sigamos administrando a nossa falta, escolhendo e deixando passar as palavras,  dando voz ao que precisamos dizer e a quem precisa falar.